sábado, 25 de dezembro de 2010

Sonora

Chora.
De alegria o meu peito.
Que já não sabe direito.
Com o que pode sonhar.

Ora,
Eu já saí de fininho.
E sentei aqui sozinho.
Esperando o trem chegar.

Não te demora.
Que o chão já tá rachando.
A poeira tá baixando.
O espetáculo vai começar.

Vam'bora.
Não podemos esquecer.
De ligar nossa tevê.
Que só quer nos separar.

Muito embora.
Você não saiba onde ir.
E não saia mais daqui.
E não vá se aventurar.

Fora!
Já não sei mais o que faço.
Eu não sou nenhum palhaço.
Para ter de te aturar.

Isso é hora?
Você não pode ficar assim.
Você não saiu de mim.
E não foi pro seu lugar.

Nossa senhora!
O que você espera acontecer?
E o que você vai fazer
Se o seu dia amanhã chegar?

Mundo afora.
E eu só preciso de um pouco.
Pra provar que não sou louco.
E nem preciso disfarçar.

Outrora.
Você era mais carinhoso.
E o tempo mais piedoso.
Demorava pra passar.

Ei Flora,
Obrigado por me ouvir.
Me dizer por onde seguir.
E poder me acompanhar.

Ora,
Pra mais um santo de desgosto.
Que não sobe mais um posto.
Nem desce pra descançar.

E agora,
Você tomou meu coração.
Mas me trouxe essa canção.
Que pra sempre eu vou cantar.

Tentativa de mais uma "música" por Aghata Miranda em dezembro de 2010.

domingo, 19 de dezembro de 2010

Fogueira

Pode deixá-lo chegar que daqui ele não passa.
Pode deixá-lo passar pra acabar com a pirraça.
Quantas as noites passei em claro esperando esse rapaz.
Que decepciona a todos cada dia que nada ele faz.

Pode por fogo na madeira que nossa folia não vai acabar.
Pode esquentar o seu peito e mandar o sujeito pra outro lugar.
Quantos momentos contei olhando esse céu tão bonito.
Que quando muda de cor traz todo o amor com seu infinito.

Hoje eu canto em cada esquina, eu canto pra você.
Ele namora todas meninas e dá uma flor à cada que vê.
Hoje eu canto em bar o que no altar não pude cantar.
Que meu dia não demora e a aurora da vida vou apreciar.

Pode pegar mais um pouco do meu alvoroço que tenho guardado.
Pode fincar no meu peito todo o rancor que eu tenha deixado.
Quantas pessoas que passam a noite lá fora ao raiar do dia.
Que amanhã vão atrás do pão mas não deixam faltar alegria.

Pode correr atrás dele que esse menino já não foge mais.
Ah meu Deus do céu você tem de alcançar esse rapaz.
Quantos já me disseram, perigoso ele era, não acreditei.
Mas hoje já sem muito esforço, com ajuda dum moço, eu já reparei.

Hoje eu canto em cada esquina, eu canto pra você.
Ele namora todas meninas e dá uma flor à cada que vê.
Hoje eu canto em bar o que no altar não pude cantar.
Que meu dia não demora e a aurora da vida vou apreciar.

"Música" composta por Aghata Miranda em dezembro de 2010.

domingo, 21 de novembro de 2010

História preta e branca

Numa folha de papel meus olhares infames voam, voam.
Desenham a solidão debaixo da chuva, debaixo do medo.
E trazem vagas lembranças de todos os meus dias vazios.
Que contornei procurando outros capotes quentes de frio.

Acordarei amanhã, uma visão vaga na janela, e verei amarelo.
Um céu pintado de todas as cores do universo.
Tantas pessoas dançando e amando amar o que chamam de vida.
Abrindo o caderno e chorando uma história colorida.

Diante de toda a beleza que diz melhorar tudo com o que traz.
Pensamentos que giram, rodopiam como gaivotas de papel, me tonteando.
E busco a fuga momentânea num copo cheio de nada.
E busco a fuga eterna abrindo a mente pro que me mata.

Texto escrito por Aghata Miranda em novembro de 2010.

Levante-se

Omito.
Limito.
Preocupo.
Desocupo.

Tento escrever.
Não consigo.
Tento esquecer.
Tento de novo.

Desato.
Te bato.
Por dentro.
Sem dó.

Te rasgo.
O peito.
No marasmo.
Bem feito.

Tento passar.
Não posso.
Tento então apressar.
Tento tentar.

Aí.
Aqui.
Em todo lugar.

Textículo escrito por Aghata Miranda em novembro de 2010.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Invenção (parte II)

_ Não consigo achar a pasta de dentes.

(pausa de alguns segundos)
(a procura continua)
(pausa de mais alguns segundos)

_ Não acho essa droga de pasta de dentes!

(mais uma pausa de segundos)

_ POR ACASO VOCÊ VIU A PASTA DE DENTES?!
_ Sim, está dentro do pote de pastas de dentes...
_ Nós temos um pote para pastas de dentes?
_ Uma vez comprei um pote de pastas de dentes porque achei que ficaria mais fácil de você encontrar.
_ Eu nem sabia desse pote idiota.
_ O comprei tem umas duas semanas e você não tinha notado? Você pega pasta de dentes nele todos os dias e não tinha reparado ainda? No que você repara afinal?

(pequena pausa)

_ Vamos mesmo discutir por pasta de dentes?
_ Esta não é a questão, a questão é o que você nota por aqui. Por acaso você me havia reparado? Porque eu estou aqui tem uns dois anos, você me pega todos os dias e, ainda não tinha visto?
_ É claro que eu vejo você, para com isso.
_ O que mais você vê, me diz!
_ Eu vejo esse quadro, esse espelho, esse lençol espalhado na cama, esse pote de pastas de dentes foi a única coisa que eu não vi por aqui!
_ Você não me vê.

(longa pausa)

_ Não irei ficar alimentando essa discussão infantil.
_ Infantil?
_ Sim, infantil.
_ Por que infantil? Só porque eu tenho razão?
_ Essa não é a questão.
_ Olha já me cansei sabia, estou com esse cansaço há dois anos.
_ Eu ainda não havia notado.

(pequena pausa)

_ Você ainda sente alguma coisa por mim?
_ Ontem à noite lhe mostrei isso, você não reparou?
_ Me diz!
_ Você não consegue ver?
_ Me diz!
_ Não.

(longa pausa, passos pesados até o sofá)

_ Por que você faz isso? Por que não acaba logo de uma vez com esse cansaço, com essa rotina, com esse pote de pasta de dentes? Por que não some logo e assim não importa mais se eu reparo ou não? Por que você não consegue acreditar no que te mostro e tem necessidade de ouvir? Não tens fé? Em mim! Não tem fé em mim? Ora essa! Acha que estive aqui por dois anos apenas concordando com o que falaras por causa de noites? Acha mesmo que ligo a televisão e me deito ao seu lado por interesse? Esperando que algo venha até a mim? Algo caia do céu? Acha que estive aqui por não ter mais nenhum lugar onde estar? Por não ter um pote de pasta de dentes? Você que não me vira, que não me notara, que não me conhece!

(longa pausa, lágrimas)

_ Me desculpa.
_ Eu te amo.

(pequena pausa)

_ Eu jamais faria nada disso, você sabe...
_ Me desculpa.
_ Eu te amo.

(pausa de dois minutos e treze segundos)

_ Sabe, não sei o que faria sem nada disso.
_ Como assim?
_ Sem você, sem discussões infantis, sem potes de pasta de dentes...

(pequenos risos)

_ Como faz piada dessa situação? Me encontro em prantos.
_ Faço piada de tudo.
_ Faz piada do nosso amor.
_ Acha isso ruim?
_ Não, amo tuas piadas.
_ Você me ama de verdade, é?
_ Amo, ora essa.
_ Faria qualquer coisa por mim.
_ Mas é claro que faria, ora essa!
_ Então, transfere todo seu dinheiro pra minha conta.
_ Acha mesmo que tem a ver com isso?
_ Não, só estava fazendo piada.

(sorrisos)

_ Que sorte eu tive de te encontrar, não?
_ Não.
_ Por que não concorda?
_ Um dia eu aprendi que sorte vai e vem, feito vento.
_ Aprendeu isso com quem?
_ Um filósofo...

(...)

_ Um mendigo.
_ Como ele conseguiu te ensinar isso, afinal?
_ Simples: ele pegou uma moeda de dez centavos do chão ao mesmo tempo que o sanduíche dele caiu pelo esgoto.
_ Entendi.
_ Mesmo?
_ Eu acho que sim, quis dizer que ao mesmo tempo que temos sorte ali, dum jeito, a perdemos aqui, doutro jeito?
_ Não quis dizer nada, eu vi.
_ E tirou conclusões, apenas isto.
_ Do que mais é feita a vida se não de conclusões?
_ De amor.
_ E como você chegou aí?

(pequena pausa, sorriso de canto)

_ Uma conclusão.

(longa pausa, cada um para o seu lado)

_ Isso é uma besteira, sabia.
_ Isso o quê?
_ Medigos, sorte, pasta de dentes.
_ Amor também?
_ Amor não.
_ Por quê?
_ Ah não sei, só consigo ver o amor como algo a cima de tudo, absolutamente tudo.
_ Felicidade?
_ Amor traz.
_ Tristeza?
_ Amor traz.
_ Pasta de dentes?
_ Bom, isso o amor não traz, mas quando se ama pouco importam as pastas, não acha?
_ Não te amaria com dentes sujos!
_ Jura?
_ Apenas piadas.
_ Me amaria de qualquer jeito?
_ Qualquer um.
_ Até muito muito muito mal?
_ Qualquer um.
_ Sem feitiços?
_ Você sabe.

_ Na verdade não, mas estou gostando.
_ Vamos lá então.
_ Me ama tanto assim, é?
_ É.
_ Por quê?
_ Não sei... eu cheguei à essa conclusão.

(pausa de quarenta e dois segundos)

_ Você já chegou à conclusão do que seria o amor?
_ Amar é dar à alguém a permissão para te matar.
_ Posso te matar?
_ Claro que não!

(pausa de)

_ Ué, você disse que me ama.
_ Mas essa não é a questão.
_ Lá vem você com isso de questão...
_ Você não pode me matar, porque não conseguiria.
_ Ora essa, te mataria num piscar de olhos.
_ Não conseguiria.

(pausa)

_ Amar então é deixar alguém lhe matar, mesmo que esse alguém não consiga?
_ Isso é amar e ser amado.
_ Então, você está dizendo que todas as pessoas que eu deixaria que me matassem eu amo? É isso que o amor significa? Permitir que alguém te mate?
_ Basicamente.

(longa pausa de olhares fixos)

_ Eu te amo.

Texto escrito por Aghata Miranda em novembro de 2010.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Felipe Pauluk

Só sei nesta vida que necessito muito de você. Não é uma necessidade suportável, diremos de suporte, para me aguentar sabe. Mas uma necessidade egocêntrica minha. Tipo, ser teu amigo, me faz sentir melhor, Renova minha alma, aquece minha vida, me faz vislumbrar o palato da amizade. Como se este sabor impregnasse dentro de mim e me fizesse sentir tal viço prazeroso por tempos. E renovando continuamente, é como se eu renascesse de mim mesmo com a ajuda do seu "eu".

Texto escrito por Felipe Pauluk em agosto de 2010.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Invenção (Parte I)

_ Não vai me perguntar o que aconteceu?
_ Por quê? Aconteceu algo?
_ Não, nunca acontece nada, mas você sempre pergunta.
_ Pois então, acho que não perguntarei mais.
_ Por quê? Não quer mais saber?
_ Não, apenas me cansei da mesma resposta por todas as vezes.

(pausa de um minuto e quatorze segundos)

_ Então...
_ O quê?
_ Não aconteceu nada?
_ Desisto.
_ De quê?
_ Tudo.
_ Você não pode desistir assim.
_ Assim?
_ É, desta forma, você desiste muito fácil.
_ Não, eu venho lutando contra isso há tempos, venho tentando não desistir há anos.
_ Você sempre pensou então?
_ Sim.

(pausa de trinta e nove segundos)

_ Ficou mal?
_ Com o quê?
_ Com o que eu disse...
_ Por que eu ficaria?
_ Não sei.

(pausa de)

_ O que estamos fazendo?
_ Não faço a menor idéia.
_ Vamos parar então.
_ Por quê?
_ Não sei, apenas desejo tudo como antes.
_ Não me parece.
_ Como não?
_ Você me transmite tantas expectativas, tantos desejos, tantos sentimentos, quando não é isso que parece ser realmente, não é o que vejo.
_ Acha que minto para você?
_ Mentir não, diria, se expressa mal.
_ Desculpe-me.
_ Não.

(longa pausa)

_ Vamos parar.
_ Não. Agora não quero.
_ Espere aí, quantos anos você tem?
_ Um pouco mais que você.
_ Não me parece...
_ Me expresso mal.
_ Sabe o que eu queria?
_ Desculpa, não quero saber.
_ Digo do mesmo jeito.
_ ...
_ Queria aquela sexta-feira.
_ Qual delas?
_ Qualquer uma delas.
_ Mas ocorreram diversas sextas.
_ Não me interessa quantas sextas, quantos meses, quantos anos.
_ Você não se interessa por nada.
_ Errado.
_ Se interessa pelo que, então?
_ Por mim.
_ Só por você?
_ Sim.

(pequena pausa)

_ Não se esqueça.
_ Do quê?
_ Somos a mesma pessoa.
_ Ah, não me venha com esta agora!
_ O que houve?
_ Me cansei.
_ Quer desistir?
_ Não.

(pausa de)

_ O que você quer então?
_ Descansar.
_ Não quer aquela sexta-feira também?
_ Não sei qual delas.
_ E de que isso vale?
_ Me diga você.
_ Detalhes são meros. Podemos querer uma sexta-feira inventada, podemos imaginar uma sexta-feira que está por vir, e a querer, com todas as forças.

(longa pausa)

_ Eu quero você.
_ E apenas me inventa, me imagina?
_ Às vezes.
_ Como assim?
_ Às vezes você não é o que eu penso que é, mesmo assim não mudo de pensamento, me engano, achando que você está sendo como eu quero, quando na verdade você não está. Odeio quando me pergunta se aconteceu algo, você sempre o faz. Mas quando não o faz, mesmo sendo o que eu quero, iludo-me pensando que não está agindo como eu queria.
_ Não entendi muito bem.
_ De fato.

(pequena pausa)

_ Podemos parar agora?
_ Não.
_ Quer tanto continuar para quê?
_ Quero entender direito.
_ Não precisa.
_ Ora! Entender não é mero, não é detalhe, é preciso. Não podemos inventar isto, você está enlouquecendo, isso que você está!
_ Calma.
_ Estou numa calmaria que você nem imagina.
_ Não precisa apelar...
_ E estou?
_ Desisto.
_ Já era de se esperar, aliás, pensei que já tivesse desistido há muito.
_ Não, desde o começo da conversa, desde quando comecei a viver, luto contra isso, esqueceu?
_ Então quando diz "desisto", o que quer dizer?
_ Apenas se foi um tempo da luta.
_ Em que você perdeu?
_ Não.
_ ...
_ Em que eu inventei ter perdido.

Texto escrito por Aghata Miranda em maio de 2010.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Soneto da conversa

Olhei para ti e teus olhos cheios d'agua.
Não tanto quanto os meus.
Olhei para ti e teu coração despedaçado.
Tanto quanto o meu.

Foi um dia qualquer, nesses qualqueres perde-se a vez.
Não esperávamos e não soubemos como agir.
Estava tudo tão igual ao que foi ontem.
Nos segurávamos até dizer a primeira palavra.

E foi decorrendo, foi escorrendo.
Quanto mais se falava, mais tristeza se tornava,
Presente, inconsciente, inconstante.

E mudava, permanecia o mesmo.
Quanto menos se agia, mais queria-se atitudes,
Ausentes, pedindo de forma gritante, errante.

Texto escrito por Aghata Miranda em 2010.